quarta-feira, 29 de julho de 2009

Raulzito















O Maluco Beleza povoou meu imaginário muito tempo. Suas letras, sua música, sua postura me deixavam ligado. Toda vez que ouço Ouro de Tolo me lembro de uma pequena cobertura que eu alugava na Rua do Carmo em Salvador, perto do Pelourinho. De tarde o por de sol esquentava e acalentava minhas tardes de novo amor. Meu primeiro casamento. Em 1971 ouvia esta música no radinho de pilha sintonizado na Rádio JB do Rio de janeiro (Era uma emissora que oxigenava aqueles duros anos de ditadura) .

Porque longe das cercas
Embandeiradas
Que separam quintais
No cume calmo
Do meu olho que vê
Assenta a sombra sonora
De um disco voador...


Fiquei alí pela Bahia uns três anos. O amor acabou (esgotou o prazo de validade). Mudei de praia, Um pit stop em Ouro Preto e dalí fui para Porto Alegre onde fiquei amigo de um monte de magrinhos. Depois de nove meses de sul brasileiro me mudei para Brasília para estudar antropologia. No restaurante da 312 Norte, onde duas negras serviam uma comida gostosa, tinha uma máquina de tocar discos (jukebox). Pagava para ouvir Metamorfose Ambulante

Sobre o que é o amor
Sobre o que eu nem sei quem sou

Se hoje eu sou estrela
Amanhã já se apagou
Se hoje eu te odeio
Amanhã lhe tenho amor


Lhe tenho amor
Lhe tenho horror
Lhe faço amor
Eu sou um ator


E várias outras músicas me ocuparam. O primeiro show que vi foi no Festival de Rock de Iacanga nos anos 80. Raul chegou pela madrugada e bateu forte. Alguns anos depois eu e o repórter Ricardo Soares entrevistamos o Paulo Coelho num daqueles botecos da Rua Augusta perto da Av Paulista. Conheci o mago.
Raul havia mandado e estava mandando todas. Foi perdendo o vigor físico.
Em 1987 quando fiz estas fotos para o Caderno 2 Raulzito estava lançando o LP Uah-Bap-Lu-Bap-Lah-Béin-Bum

Mamãe, não quero ser prefeito,
pode ser que eu seja eleito
e alguém pode querer me assassinar.
eu não preciso ler jornais,
mentir sozinho eu sou capaz,
não quero ir de encontro ao azar


Fomos eu e o repórter Ademir Assunção na casa dele que ficava no Butantã. Imagina acordar um cantor de rock as 11 da manhã. Tudo por causa do dead line do jornal que era às 14 h. Fiz várias fotos e voltamos para o jornal. Algum tempo depois me chamam no laboratório e dizem que os filmes velaram no laboratório. A barrica esfriou, veio uma onda de revolta mas o pensamento Zen tomou conta. Liguei pro Raul e ele concordou com novas fotos. Estava só, em casa. Acho que foi melhor.
Já encontrei muitos sósias do Raul por estas perambulações pelo Brasil e toda vez que ouvir a música Metamorfose Ambulante vou lembrar do som da juke box da 312 norte de Brasília. Eu prefiro ser esta metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo.
Em 21 de agosto de 1989, dois dias depois de lançar o LP a Panela do Diabo, Raul Seixas morreu vítima de um ataque cardíaco. Como dizem muitos dos seus sósias e fãs “Raul vive!” mesmo passados 20 anos.


sábado, 25 de julho de 2009

Adriana Silva veste Marilia de Dirceu


Obstinação foi a palavra que possibilitou nossa aproximação e conhecer o universo íntimo de Adriana a “Marilia de Dirceu”. Desde 2005 Adriana incorpora e se veste como a personagem da Inconfidência Mineira, passeando pelas ruas centrais de Ouro Preto com roupas de época. Marília de Dirceo é a obra poética mais conhecida do ouvidor e poeta Tomaz Gonzaga. Foi publicada em Lisboa -1792, quando o inconfidente partira para o exílio em Moçambique. É dedicada à sua noiva Maria Dorotéa Joaquina de Seixas.
O encantamento de Adriana por Marília ocorreu nas primeiras aulas de história do Brasil no capítulo da Inconfidência Mineira. “Fiquei emocionada e tocada pela intensidade do movimento político que ocorreu em Vila Rica”. Desde então a trajetória da carioca (de Copacabana) Adriana Silva de Andrade Souza se desenrolou como o passar de páginas de um livro.
Filha de pai diplomata e bancário,mãe bailarina, Adriana teve uma educação refinada. Estudou ballet clássico desde os três anos de idade, somando a seu repertório educação corporal e outras formas de dança: moderna, folclórica e flamenca. Estudou piano e teoria musical. Em Juiz de Fora frequentou parte do curso da Faculdade de Bioquímica na Universidade Federal. Fascinada por Ouro Preto, transferiu sua matrícula para a faculdade de Farmácia em 1977, mesmo ano em que fundou a primeira escola de ballet clássico da cidade “La prima Ballerina”, com mais de três mil alunos no seu curriculum.

“Marília de Dirceo”

Espiritualista, Adriana quase tem certeza que participou de algumas das reuniões dos inconfidentes dizendo que por isso coube a ela retratar a história através do vestuário, palestras e cafés literários em sua casa-museu na Rua Getúlio Vargas na Vila Rica (Ouro Preto). Transferir, re-viver a história de uma das personagens da inconfidência faz com que todos os dias faça reverências a estes personagens na Capela dos Santos Anjos que fica no porão de sua casa-antiquário com móveis e objetos da época. “Todos funcionam”, diz orgulhosa. Na parede ao lado a bandeira de Minas Gerais e um pôster de Tiradentes criam outro ambiente de reverência. “Em Ouro Preto todos contam a história da arquitetura do século XVIII e poucos dão importância para a história vivida. Cabe a mim esta tarefa e faço isto por gratidão a estes maravilhosos personagens.”
Lágrimas descem dos seus olhos ao se referir ao pouco caso com que é tratada pelos produtores culturais de Ouro Preto. “Nunca me chamaram para nada. O que me impulsiona a continuar neste trabalho são as homenagens que recebo quando faço palestras e também o aplauso dos turistas que vêm a Ouro Preto.”

Na casa antiquário Adriana espera pelo Dirceu

Sua casa tem nove cômodos com objetos e utensílios do século XVIII. É considerada como tendo o maior acervo particular da cidade. Todos os objetos têm a origem documentada e foram adquiridos no Rio de Janeiro e São Paulo. Camas francesas, móveis com tampo de mármore Carrara, a réplica de um telefone usado por D Pedro II e que funciona. E uma Maria Chiquinha – móvel do século XVIII utilizado para a higiene corporal. Fora os móveis Luiz XV, binóculos franceses e sombrinhas que ela constrói e estão dispostos entre outras preciosidades. No guarda-roupa, mais de 50 vestidos prontos para o uso “lavados e engomados”, idealizados por ela e confeccionados aa principio pela costureira Maria Monteiro, que mora no vizinho bairro do Pilar e atualmente são feitos pela modista Noézia. Estes vestidos podem ser alugados para que pessoas (adultos e crianças) possam ser fotografadas como se fossem daquela época.
Diferente do tratamento dado pelos promotores culturais de Ouro Preto, Adriana , a Marília de Dirceu fez palestras em várias cidades, recebeu homenagem em São João Del Rey e Tiradentes e espera a chegada de um Dirceu que, de preferência, venha numa carruagem pelas ruas de Vila Rica, a leve ao altar e revele:
Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
Que viva de guardar alheio gado;
De tosco trato, d’ expressões grosseiro,
Dos frios gelos, e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal, e nele assisto;
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
Das brancas ovelhinhas tiro o leite,
E mais as finas lãs, de que me visto.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela! (Tomaz Gonzaga)

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Vila Rica

Conheci uma senzala em Ouro Preto e soube que a vida útil de um escravo não passava de 7 anos. Porcos viviam melhores. O ouro era a moeda de troca. No auge, a cidade tinha mais habitantes que Londres. Neste inverno o festival homenageia o Clube da Esquina e encontro amigos no frio úmido da época do ano. Novos projetos, novos caminhos surgem como perspectivas de vida. A cidade respira inconfidências e Marilia de Dirceu (outra personagem incorpora sua personalidade) caminhando pelas ladeiras e becos da cidade se comunica com a linguagem da época oitocentista.
Do alto do Morro de São Sebastião vejo o nascer e o por do sol na mesma posição geográfica dos primeiros habitantes da região.

terça-feira, 7 de julho de 2009

Peugeot, mãos e Living Theather, entre outras.


Mais uma vez na estrada

Abri as gavetas, separei das pastas,arrumei e organizei os cromos. Depois digitalizei e junto com outras coisas cai na estrada.
Numa quinta feira, ao meio dia, peguei a Rodovia Fernão Dias e de noite chegava em Belo Horizonte. Família me esperando, cervejas e abraços. Estou de férias do trabalho regimental.
Fico em Belo Horizonte alguns dias fotografando a cidade que passa por uma mudança urbanística na Av. Antonio Carlos. No sábado de manhã, andando pelo centro e fotografando seus ícones para agencias de fotografia, passo em frente Ed. Levy onde morou os Borges (Lô e Márcio) e foi local do início da parceria com Milton Nascimento e deu no que deu: Clube da Esquina. Subi no topo do prédio e de cima fotografei os 360 graus da ensolarada paisagem das alterosas.
O Mercado Municipal fica logo ali em baixo e lá uma porção de freqüentam o mercado na socialização do fim de semana. Os pequenos bares abarrotados de gente que cantam parabéns, vendem bilhetes de loteria, divulgam doenças femininas e muitas especiarias mineiras. Saímos embriagadinhos da silva.
No domingo às 5 da manhã acordo e levo meu Peugeot flex para a feira de automóveis do Mineirão. Preciso vendê-lo. O salário não deu pra pagar as contas. Ainda no sol nascendo estaciono na vaga junto com outros carros de meu irmão. Os fregueses chegam depois das 8h. Enquanto isso vou dar uma banda nas proximidades e fotografar. Na placidez da água da lagoa da Pampulha - caminho pela margem procurando um bom ângulo para fotografar a Igreja. Obra de três grandes artistas: Oscar Nyemeier, Candido Portinari e Juscelino Kubistcheck e que tanto deu no que falar logo depois de sua inauguração (ficou anos proscrita pelo bispo mineiro que considerava sua arquitetura agressiva para os princípios católicos). É encantadora sua arquitetura e murais. Em uma posição privilegiada de ver a igreja encontro João Martins, funcionário de uma empresa que produz cimento para construções e é o responsável pelo painel de controle do enchimento dos caminhões betoneiros. Pergunto se é para ver a beleza da igreja. Ele nem sabe de quem é. “Venho aqui pra pescar e espero tirar uma boa tilápia. Vi a televisão que pescaram uma de seis quilos”.Apostava forte com três varas de pescar na espera.
Contei pra ele a origem e a história da igreja e continuei meu caminho.
Na volta, para a minha vaga na feira, rodeio o Estádio Mineirão e fotografo o lado externo. Daqui há 5 anos vai ser palco de alguns jogos da copa do mundo de 2014.
A manhã corre modorrenta e poucos interessados no meu “leãozinho”. Volto pra casa como na canção de Caetano sem ter vendido nada na feira.
Tenho um encontro com amigos. Flavia Bizzoto está abrindo uma galeria de fotografia na Savassi. Ficou encantada com o portfólio que levei. Uma boa noticia na tarde de domingo.
No início da noite vou para o alto da Av. Afonso Pena fazer fotos noturnas. O frio seco da época, nas proximidades das montanhas de minério de ferro, pede uma casaco aconchegante. Muitas pessoas esperam ali um espetáculo teatral enquanto a noite vai chegando e as exposições fotográficas exigem mais tempo de abertura do diafragma.

Chegou segunda-feira e saio para outras fotografias. Entre estes atos, nas noites e madrugadas bato nas teclas e-mails e organizo a mostra que vou fazer em Ouro Preto na abertura do Festival de Inverno.
Em 1971 junto com o jornalista Fernando Brant, fizemos uma reportagem com o Grupo Living Theater - fomos os únicos jornalistas a ver e fotografar a montagem da peça Big Mother que eles apresentaram junto com as crianças do grupo escolar de Saramenha - cidade vizinha de Ouro Preto. A reportagem foi publicada na revista O Cruzeiro em junho de 1971. Logo depois o grupo foi expulso do Brasil por porte e uso de maconha. A história é mais longa.
Vou mostrar este trabalho com o som de um duo de voz e violão. Algumas destas fotos ilustram o livro “O diário de Judith Malina”. No dia seguinte será a vez do áudio visual Mãos. Em 1974, durante o festival de inverno, fotografei as mãos dos artistas, alunos e participantes. Fiquei um mês fazendo este trabalho. Agora vou exibir a montagem original com uma nova animação e trilha sonora que está sendo criada pelo Vitor Novais.
As projeções serão no inicio da noite na parede da Escola de Minas, ao lado da praça Tiradentes. Apareçam