Em 1970 eu era um freelancer em início de carreira e fui cumprir pauta no Mangueiras – o restaurante/bar badalado em Belo Horizonte. Funcionou por muitos anos. Ficava em frente à Igreja da Pampulha. Estava fazendo uma matéria para o Diário do Commércio. Em uma das mesas o jogador Perfumo, recém adquirido para jogar pelo Cruzeiro Esporte Clube, dava uma entrevista para a revista O Cruzeiro. Fiz algumas fotos e o fotógrafo Luiz Alfredo me convidou para sentar. Ficamos ali trocando idéias e degustando um coquetel de camarão bancado pela revista. O fotógrafo da mais importante revista brasileira e eu o aspirante a. Luiz me falou de várias reportagens que fez dizendo ainda que já tinha ido até para a Russia. Fiquei só ouvidos. Me empolguei tanto que perguntei se podia visitá-lo na sucursal da revista. Ele disse que sim. Fui no dia seguinte. Dias depois estava frilando e o Luiz me apadrinhando. Me apresentou ao poeta Fernando Brant, aos fotógrafos José Nicolau e Eugênio Silva, aos repórteres Fernando Richard e José Franco que em 1963 ganhou o Prêmio Esso com a reportagem "Guapé será apenas um retrato na parede", contando o desaparecimento de uma pequena cidade do sul de Minas, inundada pelas águas da Barragem de Furnas.
Por termos quase a mesma idade fiquei mais próximo do Fernando Brant. Fizemos algumas matérias juntos. Nas horas vagas Fernando compunha letras para as músicas que o Milton Nascimento solfejava numa fita kassete. “Coração americano, acordei de um sonho estranho.” Depois do trampo frequentávamos o Saloom (um inferninho descolado de artistas mineiros). Fui apresentado e admitido no Clube da Esquina.
Luiz Alfredo é uma pessoa ímpar. Vivia as voltas com dinheiro (sempre falta). Tinha ganho uma bolada. Amarrou as notas com um barbante e ficou puxando o maço de dinheiro pela redação dizendo: “Agora fica correndo atrás de mim porque eu sempre fiquei correndo atrás de você!”. Segurando a ponta do barbante, arremessou o pacote pela janela e o puxou de volta, ou melhor, tentou, pois o barbante se rompeu e tudo caiu do sétimo andar, como chuva, sobre o telhado abaixo. Mais de 20% sumiram.
No inverno de 1971 apareceu na redação o repórter Leopoldo Oberest contanto uma história dos albinos de Alcântara e arrebatou o espírio aventureiro do Luiz Alfredo. Dias depois voaram para os Lençóis Maranhenses. “Em São Luiz pegamos um taxi aéreo e aterrissamos na areia das dunas dos Lençóis. O avião tinha a asa remendada, atolou e ajudamos o piloto a sair do atoleiro".
Na praia da comunidade de pescadores albinos fizeram a reportagem “Os filhos da lua”, publicada em várias páginas na revista O Cruzeiro. “Quando voltávamos da ilha encontramos o cearense Raimundo Silveira. O Leopoldo já o conhecia do Rio de Janeiro. Raimundo estava retirando metais nobres de navios afundados na costa maranhense.
Regendo o Lirismo - Guignard pintando Ouro Preto, foto de Luiz Alfredo
Perguntei ao Luiz quais foram as suas principais reportagens e ele citou quatro.
Três meses depois Luiz Alfredo voltou para Ouro Preto e fotografou o funeral do amigo e pintor no seu último passeio pelas ruas de Ouro Preto.
Como aventura a reportagem sobre o Parcel do Manoel Luiz foi a mais significativa. “Fui o primeiro fotógrafo a documentar o parcel. Eu me tornei fotógrafo mergulhador na marra. Fiquei quarenta dias a bordo do navio do Raimundo, com a assessoria do mergulhador e ator Arduino Colassanti”.
Esquadrilha da Fumaça foi a terceira. Para fazer a reportagem voou 28 horas, durante vários dias, nos famosos aviões T- 6 da antiga esquadrilha da fumaça, sobre o Rio de Janeiro, para reportagem comemorativa do quarto centenário da Cidade Maravilhosa.
Ainda no ciclo das aventuras a quarta reportagem foi a descoberta de uma caravela afundada em combate na Bahia de Todos os Santos, à época das invasões dos holandeses. Acharam um canhão de 1694. Para acentuar seu faro jornalístico diz: “A TV Globo foi em minha cola, mais de 20 anos depois, em três assuntos: Os Filhos da Lua, Parcel do Manoel Luiz e Caravela Naufragada na Bahia de Todos os Santos”. “Trabalhar com o Raimundo foi aventura em tempo integral. Depois que o Cruzeiro fechou, fiquei 15 anos com ele, não mais pirateando, mas como seu executivo em empresa de serviços submarinos. Mas como pirata não vive sem seu corsário, falimos todos, amem!”
Luiz Alfredo vive com sua inseparável companheira Aninha na Praia de Charitas, cidade de Niterói, no estado do Rio de Janeiro. Ali guarda negativos e cópias destas e de outras reportagens.
Depois de muitos anos afastados fui visitá-lo em 1996. Me mostrou muitas fotos de suas reportagens. Organizei seus negativos sobre o Guignard, fiz cópias de contatos e ampliações. Ofereci para muitos lugares e foram adquiridos pelo Museu Guignard de Ouro Preto. A foto do inicio deste post foi feita no dia da vernissage da exposição das fotos do Luiz. Guignard ao fundo dá uma aura de celebridade ao meu querido amigo que, tempos depois, falou pra mim que nunca tinha ido para a Rússia.
Um comentário:
Juvenal, Juvenal! Agora viajei junto com você, sabia? A cena do dinheiro sendo "arrastado" pelo escritório e a depois arremessado pela janela foi "fora-de-série"; (e eu, chorava lá no laboratório, lembra?). Enfim... Saudade da boa! Obrigada pela excelente crônica, meu querido! Grande abraço! Ceres.
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